No Expresso Curto de hoje (5/4/2018) Pedro Candeias (PC) escreve sobre a genialidade do jogador Ronaldo e inevitavelmente do soberbo golo marcado na passada terça-feira à velha senhora do futebol italiano.
Vale a pena ler o excelente texto - que se publica abaixo - reflectir sobre o mesmo, designadamente no que concerne ao essencial que tem o futebol enquanto arte e ao modelo social e politico que o mesmo representa.
PC levanta várias questões, mas deixo aqui sublinhado a referente à excelência do protagonista (Ronaldo). Portugal não pode prescindir hoje dos seus melhores, de todos, incluindo aqueles que estão fora e que actuam/trabalham em outros países - aqui entra Ronaldo.
Os senhores do futebol português prestariam um bom serviço se conseguissem, por exemplo, que Cristiano voltasse (activo) ao futebol nacional. Esta atitude seria um bom exemplo, estimularia a vinda de outros e em ultima análise ajudaria a credibilizar o futebol português.
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Julgo não chegar atrasado à discussão Cristiano Ronaldo, porque o tempo mediático, que agora tem a duração de um fósforo em combustão, ainda está congelado nas 21h04 de terça-feira. Pois que, além de marcar golos que desafiam a biomecânica na idade de Cristo, Ronaldo também faz isso: pára o relógio enquanto levita no ar como um faquir musculadoa enganar a gravidade, de costas para a baliza e com o pé direito misticamente apontado ao céu. [A propósito deste pulo o, Diogo Pombo, na Tribuna Expresso, faz-lhe uma descrição melhor do lance épico, num texto que começa numa bicicleta e acaba no Olimpo]. Hoje, à hora que escrevo, os telejornais da noite referem o 2-0 à Juventus, tal como os da tarde e os da manhã tinham arrancado com o 2-0 à Juventus; os jornais impressos, todos os jornais impressos de quase todo o lado, arrisco, deram destaque de primeira página ao 2-0 à Juventus; nas rádios também não se falou de outra coisa que não o 2-0 à Juventus e, nos lugares da internet, o 2-0 à Juventus fez manchetes virtuais a granel. Às tantas, o 2-0 ganhou vida, como um organismo. Primeiro, alimentou-se a si próprio, através do que se foi dizendo dele, de Buffon a Allegri, de Zidane a Marcelo, o único equiparável a Ronaldo ao nível do super-heroísmo, dada a sua ubiquidade. Depois, o 2-0 adaptou-se aos suportes por onde foi crescendo, no papel, ondas hertzianas, fibras óticas, algoritmos ou em tokens. E o 2-0, enfim, reproduziu-se abundantemente na forma dos-melhores-golos-da-história Zlatan gosta de números e eu também, e por isso ofereço-lhe estes: Ronaldo tem 649 golos na carreira,tantos golos (22) nos quartos-de-final da Liga dos Campeões como a Juventus em toda a sua história na mesma fase da competição. Além disso, Ronaldo marca há dez jogos consecutivos na Champions. Zlatan está a jogar nos LA Galaxy. Por outro lado, Zlatan também gosta de cinema e intitula-se Benjamin Button, mas não é Benjamin Button. Porque é Ronaldo quem não apenas pára o tempo, como parece fazê-lo recuar enquanto, usando um verbo futebolístico da moda, se projeta para a frente. É que Ronaldo está, basicamente, no futuro. Ele é o rendimento constante que se traduz em golos [estão aqui todos, especificados] e os golos são factos que não permitem subjetividades e fake news, ainda que este seja um texto subjetivo sobre o facto de ele ser objetivamente um dos maiores. Ronaldo é o talento sustentado por uma inquebrável, e inquebrantável, ética de trabalho incomum num país que se entrega facilmente ao desenrasca. É o multitasking, na medida em que começou como extremo e acabará como ponta-de-lança. É o modelo da mobilidade social, pois nasceu pobre e hoje é rico muito para lá das suas ambições - sim, o futebol paga desmesuradamente à sua elite, mas ele não tem culpa de andar há 15 anos nessa shortlist. E ele é as métricas e as visualizações das redes sociais que governam as nossas vidas: aparece normalmente no topo das celebridades com maior número de seguidores; se não está momentaneamente em número um, estará em número dois, atrás de alguém de quem ninguém se lembrará. Ao contrário de Ronaldo, a estrela verdadeiramente planetária, justificada pelas marcas e títulos que o consagrarão como um dos melhores de sempre. E a lenda continuará a engordar até quando? Até quando ele quiser porque este não será, seguramente, o último artigo sobre um golo improvável de Ronaldo. Há quem o chame extra-terrestre, mas ele é daqui, anda entre nós, embora não seja um como nós. P.S. O título deste curto aproveita-se descaradamente da mítica frase de Victor Hugo Morales no relato do segundo golo de Maradona à Inglaterra, no Mundial do México86: "De que planeta veniste?" |
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